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Atualizado: 30 de set. de 2020

Parte I –  Das Cercas vivas 


“A história humana não se desenrola apenas nos campos de batalha e nos gabinetes presidenciais. Ela se desenrola também nos quintais, entre plantas e galinhas; nas ruas de subúrbio, nas casas de jogo, nos prostíbulos, nos colégios, nas ruínas, nos namoros de esquina. Disso quis eu fazer a minha poesia, dessa vida obscura e injustiçada, porque o canto não pode ser uma traição à vida, e só é justo cantar se o nosso canto arrasta consigo as pessoas e as coisas que não têm voz”.  Assim falava o poeta Ferreira Gullar.


Por conta disso, não quero lhes falar de uma Várzea quatrocentona, nem dos heróis, cujos corpos descansam no piso de sua venerável Igreja Matriz,  que ostenta em seu frontispício a coroa imperial. Não é dessa Várzea da nobreza escravocrata, que lhes quero falar. Nem dos ricos empresários de vidro e de cerâmica, cujo mérito, já disse em outro lugar, foi o de preservar a Mata do Segredo, fazendo ecologia, quando ainda nem existia essa palavra. Não, não é dessa Várzea que quero falar.

Quero falar de cercas vivas, papoulas e crotes, que dividiam bucolicamente as quintas, as chácaras e os sítios do Engenho Velho. Uma várzea antiga e florida, que, a cada esquina, exalava um cheiro de jasmim. Quero falar das conversas, à boca da noite. Dos serões das contadeiras de estórias, dos saraus das senhorinhas, das serestas enluaradas, na rua das Laranjeiras. Era um tempo moroso e amoroso, em que se ia passear na mata, mergulhar no rio, apanhar fruta madura, passarinhar, escondidos da guarda-montada dos Brennand.






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